Sin City, para os desavisados, é um dos trabalhos mais famosos do Frank Miller, que por sua vez dispensa apresentações (quem o não conhece vá ser apresentado urgentemente!). Se trata de uma série não-contínua de histórias mais ou menos independentes, passadas em uma grande cidade no meio do deserto que surgiu, prosperou e se afundou em torno do jogo e todo o submundo tipicamente associado a ele, uma espécie de lado negro de Las Vegas. Nesse cenário, Frank Miller conta histórias que são um meio termo entre noir e Nelson Rodrigues, narradas em preto e branco (preto e branco mesmo, sem tonalidades intermediárias), que além de lhe permitir compôr quadros bem elaborados em seu minimalismo, dá forma concreta ao clima noir da narrativa -- o que de quebra dá um pequeno exemplo da potencialidade estética e narrativa dos quadrinhos. [EDIT: A imagem acima dá uma noção do que eu estou falando.] Sexo, suor, vício, traição e vingança, Miller passeia por todos os temas básicos do estilo, e consegue fazê-lo evitando o clichê.
Mas eu não tenha propriedade para falar de toda a obra: Frank Miller escreveu várias histórias nesse cenário, e além da original eu li apenas "Sin City: A Dame to Kill For" (porcamente traduzido como "Uma Dama Fatal", que discretamente inverte o sentido do título). Tanto a obra-prima que é a original quanto essa sequência estão acima de qualquer suspeita, mas consta por várias fontes que o trabalho foi decaindo e Miller tropeçou em algumas das outras histórias, talvez naquele efeito da pessoa se enconstar na força do título.
De qualquer forma, ano que vem sai essa adaptação, e embora eu sempre fique com pé atrás com adaptações assim, pelo que eu andei vendo nesse caso acho que podemos nos arriscar a ter boas espectativas. O roteiro adaptado é do próprio Frank Miller, que também está creditado como co-diretor e produtor (espero que seja algo efetivo, não apenas títulos para agradar no papel), então acho que podemos esperar uma fidelidade razoável. O diretor, por sua vez, é Robert Rodriguez, o que eu ainda não sei se é boa ou má notícia: conhecido pela trilogia do "El Mariachi" (não me perguntem, eu não vi nenhum!) e por "From Dusk Till Dawn" (aquele que a gente sempre acha que o Tarantino dirigiu, mas na verdade só escreveu), ao menos esse filmes têm um certo clima condizente com Sin City, embora mais recentemente ele tenha dirigido os filmes "Spy Kids", então sei lá...
O elenco tá uma constelação hollywoodiana só: em meio a vários conhecidos de variável grau de interesse (incluindo várias bonitinhas-mas-fraquinhas como Jessica Alba, provavelmente no papel das "amigas" de Merv e Dwight, caso nego tenha a moral de não aliviar na histórias), dá pra se destacar Bruce Willis, Benicio Del toro e Mikey Rourke (essa é afinal uma história cheia de valentões), esse último no papel de Merv, o arruinado brutamontes anti-herói que protagoniza a primeira Sin City e faz pontas em outras. Bola fora séria é colocarem o moleque Josh Harnett pra fazer o Dwight, protagonista de "Uma Dama Fatal", mania que nego tem de colocar menino pra fazer papel de homem rodado.
Mas no saldo, estou me arriscando a esperar algo de bom. Veremos.
* * *
Já "Constantine" parece estar confirmando a espectativa de que não vá dar pro gasto, a julgar pelo trailer que já está disponível por aí. Como eu já disse antes, um sujeito cuja amplitude interpretativa alcança seus ápices bradando "I want room service" no que deveria ser uma cena catártica em "Johny Mneumonic" e repetindo aparvalhadamente "Wow" em Matrix nunca vai conseguir convencer como o canastrão, cínico e picudo John Constantine. Sem falar que se nem ao se transformar em Super-Sayan Jin em "Matrix 2" ele fica louro, não vai ser para interpretar um mero londrino louro que ele vai ficar, né?
À parte do protagonista, o clima geral dado pelo trailer é de mais um filme genérico de investigação e confrontamento com forças ocultas, nada que já não se tenha visto antes -- uma pena, já que Hellblazer definitivamente foi algo que não se tinha visto antes.
* * *
A música de hoje fica sendo "Roads", do Portishead, só porque esa semana, em um cochilo breve numa sala de espera, eu acordei daquele estado de semi-consciência com essa música tocando na minha cabeça (na verdade a música precedeu o despertar, uma combinação deliciosa, uma sensação mais cinestésica do que auditiva). E como essa música é mais som do que palavras (ou ao menos é o que há de mais forte nela), citar a letra não vem ao caso aqui. Pra quem quiser, tem esse site aqui, com todas as letras do Portishead convenientemente organizadas em uma única página.