É isso aí, post grande mesmo, o papo de que o post inaugural foi excepcionalmente longo provavelmente vai acabar se mostrando o maior caô (salvo o eventual post telegráfico), e tem mais é que ser assim. Bora se acostumando a ler coisas com mais de 10 linhas, treinar a atenção -- que anda muito atrofiada -- a se fixar em um mesmo estímulo por mais de dois minutos. Por mais que eu preze o poder de síntese, têm idéias que não são expressáveis em poucas palavras. Acho que eu sou meio Ent nisso, "nunca dizemos algo a menos que seja algo que mereça levar muito tempo dizendo"... :P
Não vou ficar na paranóia de medir meus posts segundo uma suposta regra que estabeleça o curto comprimento da escrita em blog, sempre defendi submeter a forma ao conteúdo, não o contrário. Sem falar que enquanto eu não escrevo algo genuinamente meu, fico resenhando os que fizeram, que nem aqueles críticos recalcados que viram críticos por que não tiveram moral de produzirem algo seu.
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ATA!!!! Claro!! Gente, como eu não pensei nisso antes!! Ata inaugural! Ainda bem que a palavra finalmente me ocorreu, então eu não preciso agradecer ao Hazel por ter me dado essa luz. Porque não foi ele, fui eu. Aí eu aproveito e também não comento que a minha idéia (ainda não executada) de encerrar os posts com alguma música não tem, em essência, nada a ver com o modelo "se eu fosse uma chick, seria a fulana... mas então sou o beltrano". Porque não tem, é totalmente original e sem influência, que nem o Lenny Kravitz (sério, uma vez eu vi uma entrevista do péla onde ele dizia que o som dele era sem influência, pode isso?).
Valeu rapaz! :)
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Alguém me reensina em que casos "Por" e "Que" são usados juntos ou separados, com ou sem acento? Acho q hoje eu devo ter usado umas 20 vezes errado...
Sabem aquela sensação que de vez em quando a gente tem de que ninguém vai reconhecer uma determinada referência que a gente faça? Admitam, todos nós que de alguma maneira temos o desejo de ser diferente ou "alternativo" (mesmo que abominemos a palavra) temos isso, algum artista de qualquer meio que "só eu conheço", e lamentamos que não haja ninguém com quem compartilhar a referência mas, paradoxalmente, nos sentimos traídos se por acaso ele se torna conhecido. O clássico exemplo do punk que reclama que "Ratos de Porão traiu o movimento" -- embora João Gordo apresentador de talk show teen seja difícil de engolir mesmo. Triste porém verdade.
Digo isso por ter essa sensação nesse caso, de que ninguém vá soltar uma exclamação de contentamento ao ler um post iniciado por Poo-tee-weet?. Mas como eu acho muito verdadeira a afirmação de que "maiores realmente são os prazeres que são compartilhados" (tirado e traduzido -- pasmem! -- de algum manual de AD&D q não me recordo agora qual; não sei a fonte original), quero mais é compartilhar com vocês um livro que pra mim foi uma daquelas coisas que fazem a gente ficar grato pelo acaso que nos levou a conhecê-las (na presunção de que eu seja influente ou convincente o suficiente pra levar um único de vocês a procurá-lo).
Todo esse preâmbulo para falar de Kurt Vonnegut Jr., e seu livro Slaughterhouse-five (que, em um raro caso, foi fielmente traduzido como Matadouro Cinco - ao menos o filme, o livro eu nunca vi em português). Esse livro é, no meu conhecimento, o mais belo e elegante manifesto anti-bélico já feito.
Na esmagadora maioria dos casos, o discurso anti-bélico acaba se esvaziando em dois extremos insufucientes: aquele papo inócuo e pacifista, bem three-hugging hippie (vai, Cartman!), "vamos todos ser irmãos, vamos ter um mundo sem guerra", de quem acredita que meros apelos semi-demagogos e sentimentalismo barato efetuem mudança; ou a ilustração brutal e (supostamente) crua da guerra, que deveria nos chocar com a realidade e a concretude da guerra e com isso nos conscientizar contra ela, mas que acaba reversamente tendo um apelo à empolgação adolescente dos entusiastas que no fundo acham aquilo divertido (por que diabos fomos criados brincando com Comandos em Ação?!). Ao extremo pacifista, Vonnegut responderia (citando livremente), "Amigo, não é assim, sempre haverá guerra" (em um dos poucos momentos abertamente amargos do livro), e ao extremo belicoso, ele lembraria a promessa que fez a sua amiga Mary O'Hare de que, se o livro virasse filme, eles não "fingiriam que os soldados eram homens ao invés de crianças, interpretados por homens maduros e glamorosos como John Wayne ou Frank Sinatra, pra que a guerra pareça algo maravilhoso e nós tenhamos muitas outras delas, lutadas por mais crianças."
Mas eu fugi do ponto, grande resenhador dispersivo que eu sou. No limbo entre os estilos usuais de apelo anti-bélico, esse livro foi condenado de "banalizar o Holocausto", algo longe de ser verdade. Sem sentimentalismo barato, ele consegue ser mais comovente do que qualquer manifesto pacifista, e sem grafismos sanguinolentos, é tão impactante quanto um Platoon. Talvez seja por ele não ser um apelo, mas apenas um relato cínico, às vezes quase casual em seu desapego. Ele fala de coisas enormes de maneira simples e pequena, de modo que um leitor desapercebido, daqueles que esperam que a leitura já venha pré-digerida, pode passar sem se dar conta da dimensão e força do que acabou de ler. Sentimento sem pieguice, de um veterano que conseguiu ser cético sem se tornar amargo, que conseguiu se manter na fina linha entre a ingenuidade de tentar mudar o mundo e a desistência de acreditar que "não tem jeito."
Vonnegut lutou no exército americano na 2ª Guerra e, capturado, seu grupo de prisioneiros foi mandado para trabalhar em Dresden, o que foi tido como um golpe de sorte, já que Dresden ficava bem longe do front, e não tinha nenhuma importância tática ou industrial, então estava fora de perigo. Porém, o ataque com bombas incendiárias lançado pelos Aliados contra Dresden (testemunhado pelo autor e relatado no livro) permanece como o maior da história em contagem de mortos (60 mil civis, mais do que Hiroshima, que usualmente é o bombardeio mais lamentado pelos humanitários), e apenas recentemente superado em kilotonagem pelo ataque a Bagdá. O recurso utilizado pelo autor é o de "disfarçar" o livro de ficção-científica (os maiores livros de ficção-científica são isso, disfarces, para poder falar de assuntos bombásticos demais de maneira aceitável ao senso comum, como Estranho em uma Terra Estranha de Robert Heinlein). O protagonista Billy Pilgrim se "tornou solto no tempo" ("became unstuck in time" nas palavras do autor). Não é que ele viaje no tempo; sua vida prossegue normalmente e linearmente (ele luta na 2ª Guerra, é capturado em Dresden, depois da guerra se torna um respeitável oftalmologista, etc.), mas ele a vive de maneira intercalada e desconexa. Em um momento ele está sendo resgatado no final da Guerra, em outro ele é um palestrante sexagenário, em seguida se casando aos vinte e poucos anos, para depois marchar no seu primeiro dia de batalha.
Isso dá ao personagem o ar de desapego e apatia que falsamente parecem permear o livro; ele sabe o que vai acontecer em seguida porque já o viveu, ele não lamenta a morte de uma pessoa (nem a sua própria) porque já sabia que ela iria acontecer, e porque ainda vai ver aquela pessoa em outros momentos (na introdução à edição comemorativa de 25 anos, o autor até comenta sobre a Breve História do Tempo de Stephen Hawkins e a percepção linear do tempo). Isento da cronologia dos fatos, o autor fica livre para narrá-los como quiser, amarrando-os conforme sua relevância e conteúdo, de maneira tão bem sucedida que eu só posso dizer, "Leiam!"
Claro que eu tenho que encerrar citando um trecho. Na abertura do livro, o autor comenta sobre a reação do senso comum norte-americano na década de 50 ao bombardeio de Dresden, que era basicamente dizer "bem feito!", usando as mortes em campos de concentração como um suposto contra-argumento válido, naquela desumana matemática sectarista de que mortes de um lado compensam mortes de outro. Vonnegut então sutilmente comenta sobre outra cidade que foi devastada por fogo vindo do céu:
"Eu procuro na Bíblia de meu quarto de hotel por contos de grande destruição. O Sol se erguera sobre a Terra quando Ló entrou em Zo-ar, eu li, então o Senhor lançou sobre Sodoma e Gomorra uma chuva de enxofre e fogo vinda do Céu; e Ele derrubou essas cidades, e toda a planície, e todos os habitantes dessas cidades, e tudo que crescia em seu solo. E assim vai.
Aquelas eram pessoas más em ambas cidades, como é bem sabido. O mundo ficou melhor sem elas. E à esposa de Ló, claro, foi dito que não olhasse para trás onde todas aquelas pessoas e suas casas haviam estado. Mas ela olhou mesmo assim, e eu a amo por isso, pois foi algo tão humano. E então ela foi transformada em uma estátua de sal. E assim vai.
Espera-se que as pessoas não olhem para trás; eu certamente não vou mais olhar.
Eu terminei meu livro de guerra agora. O próximo que eu escrever vai ser divertido. Esse aqui é um fracasso, e tinha que ser, já que foi escrito por uma estátua de sal."
Obrigado às boas-vindas e palavras de encorajamento do pessoal, motivação cai bem de vez em quando... :)
Hj não vou postar (anglicismo meio desnecessário, vou evitar) nada demais, amanhã vou ver se rumino algo interessante. Daí vou também ver se inicio algo que pretendo que se torne um padrão aqui, encerrar cada post com uma citação/referência/recomendação musical, de preferência que tenha algo a ver com o que tenha sido escrito. Algumas amigas vão reconhecer uma tentativa nostálgica de reviver os tempos de catequese musical via FTP...
Ah, e foi trazido à minha atenção que o termo "Ementa" foi usado indevidamente no post inaugural. Uma ementa não contém verbos, listando apenas os objetos que serão conteúdo do programa apresentado. Que palavra eu uso então? Eu queria algo que soasse propositalmente pomposo, com a idéia de uma apresentação geral e inicial dos princípios a serem seguidos (tipo a declaração quando se inicia uma sociedade ou clube). Razão Social, Carta Magna, Ementa, nada se encaixa, o mais próximo (eu acho) que me veio à mente foi statement of purpose, mas bora manter em português na medida do possível, né?
Catzo, apanhando do counter da bravenet q tá bagunçando o coreto do meu template, esse post é só pra re-publicar e ver se resolvi.
Personal webmaster, cadê vc, me acuda! :P
Bom, então é isso aí, encerrada a cerimônia de abertura. Agora eu tenho um blog, vamos ver no que vai dar. Com o abuso da boa vontade da minha personal-webmaster Lia, depois eu vou deixando a cara da casa mais simpática, mas por hora vai assim mesmo.
Enfim, mais um que cede a esse lance de blogar. O que quer que role por aqui, deve ser regido por duas considerações centrais pra mim: pra que serve um blog, e a questão de referêncas e citações. (Esse post inaugural vai ser excepcionalmente longo e dissertativo, mas na média eu sou menos chato do q isso, na programação normal devem rolar coisas mais interessantes por aqui -- espero!).
Quando começou essa onda, eu meti o malho, tomando um açaí com o Will e a Ulli, criticando que tava aí mais uma maneira banal de pessoas escreverem e lerem coisas banais, no estilo reality-show "querido diário, hoje eu fiz tal coisa com tal pessoa" (só nesse comentário já devo perder uma dúzia de leitores em potencial...). Depois eu me toquei que a minha crítica, embora certa, era mal direcionada: blogs são apenas mais um veículo de comunicação, e o veículo em si não pode ser julgado positiva nem negativamente pela mensagem transmitida nele. Que a grande maioria do que se lê por aí seja uma enfadonha perda de tempo não é falha dos blogs, mas mero reflexo de que a maioria do que se vê em toda parte seja uma enfadonha perda de tempo! Se o veículo então é neutro, comecei a ficar tentado a ver se eu poderia ser uma das pessoas capazes de dar carga positiva a ele, e a aproveitar pra desempoeirar minha escrita.
Bom, com isso em mente, fica mais fácil dizer a que esse blog não se propõe: Esse blog mais do que tudo não se propõe a ser um diário. É claro que o que uma pessoa escreve é produto de onde e como ela está em dado momento, então incidentalmente coisas que eu escreva vão ser direta ou indiretamente relacionáveis com minha vida pessoal, mas eu pretendo a todo custo evitar o exibicionismo de relatos diários. A quem interessa o que eu fiz hoje? A menos que eu tenha alguma crítica que eu julgue relevante sobre o filme que eu tenha visto no cinema, a quem interessa que filme eu vi hoje?
Têm ainda outras coisas às quais "esse blog" não se propõe (eu coloco na 3a pessoa, quem se propõe ou não é ele, eu não tenho nada com isso!), mas agora nao estou lembrando; conforme me lembre, remendo aqui, mas o mais importante era o Primeiro Mandamento A Single Kiss "Não escreverás um diário" mesmo.
A questão das referências e citações vai mais de encontro a o que esse blog deve vir a ser. Em uma citação ao quadrado, eu cito algo que eu li que se tornou central em minha visão de mundo: Harlan Ellison, na introdução a "Sandman - Season of Mists" do Neil Gaiman, discorrendo (ele é dessas pessoas que adoram discorrer longamente sobre assuntos retóricos) sobre excelência e mediocridade, cita o crítico literário John Simon dizendo "Não há sentido em dizer menos do que seus predecessores disseram" (que pode ser tomado como o Segundo Mandamento A Single Kiss). Como quando eu comento sobre música, e bandas feitas em série sem nada de novo para dizer: "na dúvida, fique com o original". Esse blog deve ser primariamente dissertativo, comigo ruminando sobre assuntos diversos q me ocorram. Mas como eu tenho plena noção de que muitas das coisas que eu posso querer dizer já foram melhor ditas antes, por vezes muito do que eu escreva deve ficar com cara de colagem de citações. Que seja! Se alguém já disse algo melhor do que eu e eu sei disso, que ele fale por mim! Por vezes devo soar meio chato fazendo questão de explicar quem disse o quê, mas acho isso um mal necessário pra não passar a vergonha de ser uma daquelas pessoas que se apropriam das palavras dos outros e as vendem como delas próprias – gozando com o pau dos outros, pra colocar em português chulo e claro.
Enfim, divirtam-se. No fundo eu não estou escrevendo esse blog pra vocês, mas pra mim. Os poucos e enventuais leitores (ou mesmo a minha ilusão de que haja algum) são amparo para a minha escrita; se meu lance pedante e ruminante é discorrer e dissertar, eu preciso de leitores a quem dissertar – anotações pessoais não fariam sentido, não faz sentido pregar aos convertidos, dissertando a um leitor que já conheceria as idéias expostas. De qualquer forma, tenho esperança de que alguma coisa que eu escreva possa ser útil pra alguém além de mim mesmo. E pensando bem, isso aqui é uma primeira viagem, test drive pra ludicamente aprender a fazer algo melhor mais adiante, e qualquer desculpa ou disclaimer que eu possa fazer aqui já foi melhor dita assim:
"If we shadows have offended,
Think but this -- and all is mended --
That you have but slumber'd here
While these visions did appear.
And this weak and idle theme,
No more yielding but a dream,
Gentles, do not reprehend;
If you pardon, we will mend.
And, as I'm an honest Puck,
If we have unearned luck
Now to 'scape the serpent's tongue,
We will make amends ere long;
Else the Puck a liar call:
So, good night unto you all.
Give me your hands, if we be friends,
And Robin shall restore amends."
W. Shakespeare -- "A Midsummer Night's Dream" Ato V, Cena II