Gente, e não é que o remake de Dawn of the Dead é bom? Digo, realmente bom! Esse filme me remeteu diretamente à minha discussão sobre músicas covers: uma boa versão cover não deveria ser uma mera repetição do original (se não qual o sentido em fazê-lo?) nem uma reformulação total da original a ponto de ser uma música completamente diferente. E é exatamente o que Zack Snyder conseguiu com esse filme, manter fielmente cada ingrediente e "regra" criados por George Romero, mas com toques que não só atualizam como expandem o tema, fazendo algo maior do que o original mas ainda assim fiel a ele.
Ele consegue não ficar na mera repetição do gênero; a impressão que dá é de que o diretor se perguntou "como será que o Romero teria feito se ele tivesse um orçamento hollywoodiano para a produção?". O que eu acredito ser o diferencial dessa adaptação é a total falta de experiência de seu diretor (nem uma experiência anterior como membro técnico no IMDB). Ao invés de termos um diretor virtuoso querendo dar seu toque a um tema clássico, temos um ávido fã que cresceu vendo os filmes de Romero e outros tantos, e que fez uma minuciosa e respeitosa homenagem ao original (imagem visível nas entrevistas promocionais do filme). Todos os ingredientes estão lá, com algum background em filmes do gênero o espectador é capaz de cantar cena a cena o que acontecerá a seguir, e ainda assim ser afetado -- uma grande mérito do filme, não depender de susto para dar medo, você sabe que aquela pessoa vai virar zumbi, que aquele vulto não é de alguém vivo, que aquela cena plácida vai ser quebrada por algum som estridente e impactante, e ainda assim pula na cadeira quando acontece.
Ele é, de fato, um filme para fãs do gênero, sem se preocupar em explicar o como e o porque da epidemia de zumbis; por um lado, você já sabe, por outro, não importa, é algo que simplesmente aconteceu sem que ninguém saiba porque, reforçando o terror do desconhecido. Ele vai direto ao assunto, in media res, e mesmo nos poucos minutos de filme que precedem o início da correria o espectador se liga que a epidemia já está rolando mas ninguém se deu conta ainda. E uma revitalização interessante é o aumento do âmbito da epidemia: em todo filme de zumbis (tanto do Romero quanto outros), os zumbis são sempre um surto local de alguma cidade pequena, que em algum momento será isolado e contido (ineficientemente, claro, para que haja continuações), então só quem está ameaçado são as pessoas imediatamente próximas. Aqui não, a epidemia assolou toda a humanidade (ou apenas os EUA, o que para efeitos do filme dá no mesmo), não há para onde correr, dando um claustrofóbico ar de desespero sem precedentes no original.
E o comentário social também foi revitalizado: cada filme da trilogia de Romero se passou em uma década diferente, cada um comentando algum fator social preemente em sua respectiva década. Logo, Zack Snyder foi tão fiel ao original a ponto de não se ater à crítica original de Dawn of the Dead: a crítica original ao consumismo continua lá, aliada à crítica atual à banalização e dessensibilização da violência, com os sobreviventes ilhados ludicamente passando tempo praticando tiro ao alvo com zumbis, como se fosse a coisa mais natural do mundo.
Mas não se enganem, apesar de uma risonha revisita aos filmes de zumbi de nossa infância, o diretor sabe, assim como seu predecessor, ir além das tripas e miolos voando, conseguindo uns momentos bem tensos e assustadores. E fala sério, os zumbis dele correm, coisa que foi objeto de crítica de muitos fãs mais tradicionais, para quem os zumbis avançando lentamente rumo a suas vítimas era algo muito mais assustador. Pode até ser o caso de espectadores massificados atuais não terem a sutileza para apreciar algo reqintado, mas uma horda de zumbis avançando correndo com toda a urgência de sua fome por carne, dando aos acuados sobreviventes apenas segundos para reagir, me parece algo instintivamente muito mais assustador - um predador que vai te alcançar em segundos é muito mais ameaçador do que um outro que vai te alcançar semana que vem.
Eu fui ao cinema no pique de cumprir minha obrigação com o gênero, e saí com a crença revitalizada de que tal gênero ainda tem algo para oferecer.
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O que parece ser mais do que se pode dizer dos filmes com os outros habitantes monstruosos de nosso imaginário, os vampiros e lobisomens. Infelizmente eu não tive a oportunidade de assistir "Underworld" (só salas ruins ou distantes, o filme não merecia tanto esforço), mas o primeiro contato com trailers já dizia que seria um lixo tóxico. Eu queria muito ter visto, naquela de "putz, deve ser muito ruim, TENHO que conferir", mas vários depoimentos me disseram que até enquanto filme ruim ele é ruim!
Outro que eu pretendo muito perder (ou talvez veja só pela estética mesmo) é Van Helsing, mais um da família de filmes de vampiros dos últimos anos a colocar caçadores de vampiros com um ar de cowboy usando equipamentos ao mesmo tempo medievais e futuristas (muito cromo por toda a parte): "Vampiros do Deserto", "Vampiros de John Carpenter", "Drácula 2000", e por aí vai. Parece realmente que o sangue novo (sem trocadilho, por favor) nesse gênero se esgotou com "Entrevista com o Vampiro", e de lá pra cá o cinema vem apostado na falta de memória do espectador para nos trazer sempre mais do mesmo.
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E fechando com chave de ouro minha orgia literária, semana passada eu ganhei edição em volume único de "Senhor dos Anéis" da Harper-Collins, aquela com o Gandalf como um andarilho determinado vagueando pela Terra-Média. Finalmente, vou poder ler Tolkien com as palavras de Tolkien! :)
Falando no velho Corvo das Tormentas, isso me remete àquele meu comentário sobre músicas existentes que seriviriam como tema para personagens ou cenas de "Senhor dos Anéis". E essa talvez até seja inspirada mesmo nele, já que aquele hippiezada da época de modo geral se amarrava em Tolkien:
Black Sabbath - "The Wizard"
"Misty morning, clouds in the sky
Without warning, the wizard walks by
Casting his shadow, weaving his spell
Funny clothes, tinkling bell
Never talking
Just keeps walking
Spreading his magic
Evil power disappears
Demons worry when the wizard is near
He turns tears into joy
Everyone's happy when the wizard walks by
Never talking
Just keeps walking
Spreading his magic
Sun is shining, clouds have gone by
All the people give a happy sigh
He has passed by, giving his sign
Left all the people feeling so fine
Never talking
Just keeps walking
Spreading his magic"